Floresta Fantástica é parte de um projeto maior, a procura
de pinturas ou desenhos feitos exclusivamente pelas forças e materiais da
natureza. Livi relata que fotografou essas imagens, instantes de
“paisagens” em contínua mutação, em caminhada numa praia distante. O fenômeno
inusitado que as gera resulta das interações do mangue e do trabalho das ondas
com a areia, a qual serve de suporte para esses desenhos. Os pigmentos
dominantes provém das infiltrações do material orgânico que se desloca com
as flutuações das marés.
Segundo
o artista, a Galeria Lunara
parece ter sido feita especialmente para este projeto, pois, além das
fotografias, permite a projeção dos pequenos vídeos em loop, nos quais capturou alguns momentos daquela atividade do
mar, da areia e da infiltração do mangue.
Natural
de Cachoeira do Sul, Rogério Livi é Doutor em Física, pela UFRGS, onde foi
professor e pesquisador. Desde 1998 cursa oficinas no Atelier Livre da Prefeitura
e dedica-se, principalmente, à fotografia, escultura, desenho e história da
arte.
Desde
2005, Rogério Livi tem apresentado seu trabalho em exposições coletivas e
individuais, tendo recebido vários prêmios, dentre eles, Artista Revelação
(Açorianos de Artes Plásticas de 2008) e Artista Revelação (RBS Cultura, 2009).
Abaixo,
texto de Paula Ramos, escrito especialmente para a exposição:
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Os
desenhos encontrados de Rogério Livi
“Olhe para certos muros manchados de umidade ou para
pedras de cores irregulares. Se você usar algumas lembranças, poderá ver nelas
paisagens adornadas com montanhas, ruínas, rochas, florestas, grandes
planícies, colinas e vales em grande variedade. Olhe novamente e verá batalhas
e estranhas figuras numa ação violenta, expressões de faces, roupas e uma
infinidade de coisas.” Leonardo da Vinci
Ao
escrever as notas que dariam origem ao livro conhecido como Tratado da Pintura, Leonardo da
Vinci (1452–1519) recomendava que os artistas exercitassem a imaginação
apreciando manchas e texturas em velhos muros. Seus apontamentos, voltados ao
processo criativo do pintor, sinalizam algo fundamental também ao espectador: a
capacidade de observar, de reconhecer e de imaginar. Tal consciência, da imagem
que engendra novas imagens, estimulou diversos artistas ao longo dos séculos,
de Alexander Cozens (1717–1786) a Vera Chaves Barcellos (1935), e serviu de
mote ao grande historiador da arte Ernst Gombrich (1909–2001). Em um dos textos
mais instigantes de Arte e
Ilusão, Gombrich discorre
sobre a faculdade humana de projeção, que se manifesta, por exemplo, quando
identificamos nas nuvens formas de coelhos, cavalos, trens. Rogério Livi, com
sua Floresta Fantástica, aborda o mesmo tema, porém de modo
distinto. Isso porque ele é, primeiramente, o espectador embevecido e, na
sequência, o artista proponente do que denomina “desenhos encontrados”.
Caminhando
por uma praia do Nordeste brasileiro, Rogério se deparou com estranhas
formações que despontavam, discretamente, à beira mar. Sacou a máquina
fotográfica do bolso e registrou, com o cuidado de excluir elementos
desviantes, o que lhe parecia uma deslumbrante floresta. Nela predominam
troncos encurvados e esguios, copas diminutas e desfolhadas, as cores
rebaixadas de uma mata outonal, a sugestão de trilhas na caprichosa ilusão da
terceira dimensão... Misteriosos, esses “desenhos” são, na sua estrutura
primordial, obras da natureza: eles resultam da confluência da água sedimentosa
do mangue com a água salgada do mar, em escala diminuta. Estaríamos diante de
mais um invulgar fenômeno físico-químico, se o olhar atento e sensível do
artista não tivesse registrado, em meio ao rápido movimento das ondas e ao
deslizar contínuo das areias, as linhas que lhe sugeriam paisagens tão quiméricas,
o prodigioso artifício em meio à natureza.
As
fotografias/desenhos de Floresta
Fantástica apontam a sutil
articulação de dois domínios: o da ciência, com sua busca pela compreensão
racional dos fatos, e o da arte, com sua interpretação poética dos mesmos
fatos. Não é de admirar que Rogério tenha circulação franca nas duas áreas.
Respeitado pesquisador de Física, o Professor Titular aposentado da UFRGS
sempre teve fascínio pela imagem e, sobretudo, pelos arranjos mínimos da
matéria, que examinava através de microscopia eletrônica. Gostava, igualmente,
de analisar marcas e vestígios na natureza, reconstruindo suas possíveis
origens. Assim, quando iniciou seu percurso no campo da arte, estendeu a seus
trabalhos essa experiência, explorando genuinamente aspectos como equilíbrio,
suporte, movimento, bem como o caráter indicial da imagem, que ele enxerga no e através
dotempo. O artista tem consciência de que seus desenhos – sejam eles
provocados pelo vigoroso choque entre bolhas de sabão e papel; derivados do
processo de infiltração do mangue na areia da praia; ou estruturados nas
constelações sugeridas pelos galhos de árvores que coleta – são decorrência de
várias camadas de tempo: o tempo da matéria, da conformação e da dissipação e o
tempo que confere maturidade e segurança ao olhar, permitindo-lhe a surpresa e
o encantamento da descoberta, seja na esfera da ciência ou da arte.
Rogério
Livi integra o grupo de artistas para o qual observar o mundo sensível com
desvelo, como preconizado por Leonardo da Vinci, é a base da criação. Seu
exercício substancial reside, portanto, em permitir-se olhar, recolher e propor
novas relações. Daí a importância dos títulos em suas obras. Eles jamais são
fortuitos, agindo como delicados catalisadores no processo associativo e
simbólico provocado pelas imagens. Com Floresta
Fantástica, Rogério nos
convida a percorrer esse ambiente onírico e de fantasia, descortinado num final
de tarde de inverno à beira da praia. Para os que cresceram lendo as histórias
dos Irmãos Grimm, trata-se de um autêntico cenário de conto de fadas.
Paula Ramos
Crítica de arte,
professora-pesquisadora do Instituto de Artes da UFRGS
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Floresta
Fantástica
Rogério
Livi
Galeria Lunara
(5º andar da Usina do Gasômetro)
Abertura dia 09 de maio, às 19h
Visitação até 09 de junho de 2013
de terças a domingos - das 9 às 21h
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